Poesia em dois versos
Textos Selecionados
A mente humana tenta unir os elos
De imaginários mundos paralelos.
O bom senso em desuso
Torna o mundo confuso.
Na vida calma dos bois
Não há antes nem depois.
As religiões, aos poucos,
Geram seus próprios loucos.
De um fósforo aceso, o lume
Também ilumina o estrume.
São os pensamentos sábios
Que disciplinam os lábios.
Amuleto ou talismã
Não protege o amanhã.
.
Nossas mentes são colmeias
De pensamentos e ideias.
Tremem velas no velório:
O adeus ao ser transitório.
O amor, como um chafariz,
Dessedenta os bons e os vis.
Há vidas que são o entulho
Do ódio, da inveja, do orgulho.
O amor, como um chafariz,
Dessedenta os bons e os vis.
Há vidas que são o entulho
Do ódio, da inveja, do orgulho.
Até mesmo o lodo
É parte do Todo.
Sempre existirão profetas
Para iludir os patetas.
Qualquer apostolado
Deixa a razão de lado.
Contra a toga e a batina
Não existe vacina.
A beleza ri e dança
Nos olhos de uma criança!
A vida é sempre a média
Entre a tragédia e a comédia.
A hipocrisia se enfuna
No púlpito e na tribuna.
Quem na vida não foi tentado,
jamais amou ou foi amado.
Democrático é o esquife:
Acolhe o justo e o patife.
Mística tolice: a castidade
Não é sinal de santidade.
A árvore não faz escolha
Entre o fruto, a flor e a folha.
Livremo-nos ao menos
Dos nossos venenos.
Quanta gente sente falta
Do seu tempo de ribalta!
Quem pode romper as grades
De tantas férreas saudades?!
Há almas que, como o abutre,
Só de carniça se nutre.
Nem o calor da bigorna
Um coração frio amorna.
No mundo de misérias,
A bondade entra em férias.
Talvez nos corações de duro cerne
A semente do amor ainda hiberne.
Somos anjos ou demônios
Conforme os nossos hormônios.
A felicidade flora
Somente no chão do agora.
O passado recompomos
Com pedaços do que fomos.
Nunca o apego à vida é tão profundo
Quando vemos morrer o moribundo.
Não confundamos o êxtase dos ascetas
Com o pasmo obtuso dos patetas.
Seremos sempre um Prometeu
Atados às correntes do eu?
A vida sem loucura e sem paixão
Apodrece de paz e solidão.
Cansei-me de átomos e partículas.
Quero emoções mesmo ridículas.
Às vezes, da vida, a tessitura
É feita com fios da amargura.
O pensamento se lavra
No duro chão da palavra.
Na argila de mim mesmo me componho
À semelhança do que sou em sonho.
A faxina do que fomos
deixa mais leve o que somos.
Há momentos de estranha lucidez
Em que nada é mais certo e, sim, talvez.
Nem sempre a dor e o suor
Tornaram alguém melhor.
Se existiu um mundo edênico,
O atual é esquizofrênico.
Em todo o universo não há centro,
Nem o lado de fora ou o de dentro.
O vinho que a vida nos entrega
Não deve ser guardado em nossa adega.
Para as humanas questões
Não servem as equações.
Na natureza, o perfume
Vale tanto quanto o estrume.
No mundo agora entrelaçado em redes,
Não mais existem muros e paredes.
Não posso apagar a cicatriz
De todas as coisas que já fiz.
Da indulgência dos bons, o que se espera?
Onde se tolera os maus, o mal prospera.
Quantas pessoas são
Enfermas de solidão!
Das guerras, tantos destroços!
De tantos sonhos, os ossos.
São sempre os paradoxos
Que afligem os ortodoxos.
A saudade retorna a cada instante
À boca da memória ruminante.
A paixão, que nos fere, se assemelha,
No coração, ao corte de uma relha.
A vida com seus custos.
O acaso com seus sustos.
São naturalmente opacos
Os mentirosos e os fracos.
O apego ao que se tem
É um cárcere também.
A mente que é sempre ávida
vive, de ideias, grávida.
Os prazeres mais amenos,
Podem ocultar venenos.
O amor é a dopamina
Que nos vicia e domina.
Tornamo-nos abjetos
Pelo apego aos objetos.
Talvez o teólogo inveje
A liberdade do herege.
O amor apaga os vestígios
Dos mais odiosos litígios.
A dor da saudade
Não tem idade.
O gênio tem, como ventura,
A sua lúcida loucura.
Vão-se as dores, o sonho, a fama e a glória.
O tempo é a borracha da memória.
O aroma que sai do turíbulo
invade a igreja e o prostíbulo.
Mesmo os pequenos vícios
Tornam-se vitalícios.
Tantas figuras seráficas
Somente existem nas gráficas.
Viver é meu ofício,
Pensar, meu exercício.
A vida a alguns ensina
A ser ave de rapina.
Sempre me causa embaraço
O bem que não fiz, ou não faço.
Nesse mundo, a confiança
É uma ingênua criança.
Todos os nossos apegos
São cegos como os morcegos.
Eruditos? Evitai-os.
Muitos são papagaios.
A vaidade, como a esponja,
Absorve qualquer lisonja.
Dos campos de batalha, nas trincheiras,
Quantos sonhos frustrados nas caveiras!
Há ainda quem se ilude
De que sofrer é virtude.
Por que, ó crente, te afliges?
Deus não é o bóson de Higgs.
Somente o surdo não receia
Ouvir o canto de sereia.
Revejo a mocidade,
Debruçado na saudade.
A passagem da vida não demora:
Folha verde ontem, folha seca agora.
Quantas ideias tu lavras
Com sementes de palavras!
A alma também se asila
No vegetal, na argila?!
A razão vence.
A emoção convence.
Para os ardores genésicos
Não existem analgésicos.
Quem, de si, gasta pouco
É avarento e louco.
A vida em feita de fios,
Ligando, entre si, os vazios.
Na morte, não há barganha:
Você perde, ela ganha.
Bem-aventurados os ateus:
não morrem em nome de Deus.
Que a dor dos outros nos revele
Que o mundo é também nossa pele.
Da tua vida, não prives
De ser o seu próprio ourives.
Nos berços e nos ninhos
Começam os caminhos.
A dor à vida se atrela
Na mansão ou na favela.
Acabemos com essa ânsia:
Nada tem importância.
Quando invernamos, as saudades chovem.
Foi-se nosso verão. Morreu o jovem.
A ciência ensina.
A arte fascina.
Nada temos além do presente
E do que temos no presente.
No corpo envelhecido surgem marcas
Do destino traçado pelas Parcas.
Nos álbuns de retratos,
Aprisionados fatos..
Quem vive uma vida tensa
Não sai da convalescença.
Em nós, o infinito interior,
Contempla o infinito exterior.
Para mim, é bastante
Viver pleno em cada instante.
Quem é capaz de ouvir o cântico
Do universo quântico?
Na mesa do mundo ponho
O meu mais ousado sonho.
As pessoas são, ano após ano,
Sonâmbulas do cotidiano.
A vida plena no tripé:
Razão, emoção e fé.
Mesmo no escuro espesso,
Como a planta oculta, cresço.
Atamos tantos nós...
Quem nos salvará de nós?!